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A gestão democrática de processos e a tutela da função social da empresa no sistema de insolvência brasileiro

terça-feira, 17 de março de 2020

Atualizado às 09:21

Texto de autoria de Daniel Carnio Costa

Desde o início da vigência da lei 11.101/05 surgiram diversas teorias que tentam explicar e otimizar os resultados do sistema brasileiro de insolvência. Da mesma forma, tornou-se frequente a importação de soluções estrangeiras, notadamente norte-americanas, para os problemas vivenciados nos anos de aplicação das ferramentas de insolvência criadas pela legislação pátria.

As teorias da superação do dualismo pendular e da divisão equilibrada de ônus são, por exemplo, algumas das teorias por mim desenvolvidas e que tentam explicar as finalidades do sistema de insolvência brasileiro. A perícia prévia (constatação prévia), o critério tetrafásico de controle judicial do plano e a gestão democrática de processos são outros exemplos de minhas criações jurisprudenciais que visam otimizar os resultados do sistema brasileiro de insolvência.

Entretanto, não obstante a existência dessa gama de novidades (batizadas de "novas teorias"), uma delas será o objeto de análise nesse trabalho: a gestão democrática de processos de insolvência.

Objetiva-se, nesse espaço, demonstrar que a gestão democrática de processos é uma teoria/metodologia que otimiza os resultados do sistema de insolvência brasileiro, estando em total sintonia com os seus fundamentos de existência e de acordo com os valores tutelados pela falência e recuperação judicial de empresas no Brasil.

Inicialmente, é importante frisar que a interpretação das regras legais de um sistema de insolvência empresarial, para que seja útil e adequada, deve sempre observar pertinência com os objetivos maiores desse sistema e com os valores por ele tutelados. Da mesma forma, a criação de mecanismos jurisprudências de ajustes na aplicação das regras legais não pode destoar dos valores informativos do sistema como um todo.

Assim, a criação de novas teorias e a importação analógica de soluções estrangeiras para os problemas brasileiros devem sempre estar atentos à compatibilidade com os fundamentos do sistema brasileiro de insolvência.

Nesse contexto, esse artigo demonstrará que a técnica da Gestão Democrática de Processos1 é criação jurisprudencial compatível com os fundamentos do sistema brasileiro e de grande valia para que seus objetivos maiores sejam cumpridos, tutelando-se eficazmente os valores que informaram a edição da lei 11.101/05.

Para tanto, se faz necessário identificar os fundamentos normativos do sistema de insolvência brasileiro, bem como seus objetos de tutela, contextualizando a evolução do pensamento jurídico desde os debates normativos ocorridos nos EUA no século XX, até o estabelecimento das ferramentas brasileiras criadas pela lei 11.101/05 (falência e recuperação de empresas).

É sabido por todos os que atuam na área da insolvência empresarial que o modelo brasileiro de recuperação de empresas se inspirou no modelo criado pelo Código de Insolvências dos EUA. Entretanto, principalmente em tempos de mudanças legislativas na regulação da insolvência empresarial no Brasil, é importante destacar que os valores que inspiraram o modelo norte-americano não são os mesmos que determinam a aplicação dos institutos da falência e da recuperação de empresas no Brasil.

É preciso ter atenção quando se pretende aplicar analogicamente no Brasil os institutos criados pela legislação e pela jurisprudência norte-americana.

O Brasil superou o dualismo pendular - movimento já descrito por Fábio Konder Comparato - desvinculando-se da dualidade de tutelas de interesses de credores e devedores e optando por estabelecer como vetor de aplicação dos institutos da insolvência empresarial a tutela do interesse social, considerando esse interesse prevalecente sobre os interesses das partes diretamente envolvidas na crise da empresa (credores e devedores).

No Brasil, o modelo de insolvência não é puramente pró-credor, nem puramente pró-devedor. Busca-se compatibilizar os diversos interesses envolvidos na crise da empresa, inclusive os interesses sociais, de modo a tutelar de forma prevalente a preservação dos benefícios sociais e econômicos decorrentes da atividade empresarial.

Nesse sentido, a fim de demonstrar os fundamentos do sistema de insolvência brasileiro, se faz necessário explicar a evolução das abordagens filosófico-normativas que já foram objeto de muitas discussões nos EUA.

Confira a íntegra da coluna.

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1 Costa, Daniel Carnio. Jornal Carta Forense, de 4/11/2014. Disponível aqui.